quarta-feira, 29 de julho de 2009

O Presente

O que hoje recebes
e não podes pegar, guardar
em panos e papéis laminados,
é imperecível,
presente onipresente.
Estás com ele na chuva
e não temes que se desfaça.
Estás com ele na multidão
e não o escondes dos mutilados.
O que não existe para os homens
deles estará protegido,
o que os homens não vêem
não poderão espedaçar.
Eis o que não te denuncia
porque não tem face
nem volume para ser jogado no mar.
Eis o que é jovem a cada lembrança
porque não tem data
e série, para envelhecer.
O que hoje recebes
não pode ser devolvido.

Alberto da Cunha Melo

terça-feira, 14 de julho de 2009

O nenê e as sensações

Sinto as suas andanças pelo meu ventre, este reduzido e confortável espaço. Sensação única. Não é como a sensação de ter um braço, por exemplo, tu sabes que o braço está ali e o movimenta meio que automaticamente, sem sentir. Ou como outro órgão, como o coração, que tu sentes que está ali batendo e a sensação, sei lá, psicológica, é que ele faz parte do teu organismo. Eu também sei que o nenê (como o chamo) está ali, mas a sensação é de que há algo diferente dentro de mim e que não sou eu ou não é do meu organismo. É a maneira mais fácil, talvez simplista, de explicar ao meu marido as minhas sensações.
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Por essas e outras que é enganação dizer que a mulher pode fazer o que quer com seu corpo (frágil argumento de abortistas), já que o bebê não é o seu corpo, mesmo que não o chamem por bebê, mesmo que ele esteja na fase inicial. Com doze semanas, não parece, mas ele mexe bastante, a mãe é que ainda não sente.
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Antes eu achava que nove meses era tempo demais para uma gestação. Mas Deus foi sábio ao criar a natureza ou a natureza é sábia (como dizem por aí) porque Deus o é. E para tudo há um tempo debaixo do céu... No começo eu sabia que estava grávida e que seria mãe e não passava muito disso, psicologicamente falando. Depois passei a ter noção de que carregava um filho (lá pelo terceiro para o quarto mês). Agora, no início do quinto mês, é que já começo a me sentir mãe e a conversar com ele me chamando de mãe: “ah gurizinho lindo da mãe”, por exemplo, não diria a um mês atrás com tanta naturalidade. Nove meses é o tempo exato.
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Esta semana tive dores abdominais. Daí me disseram, inclusive a médica: “é normal”. Pode até ser normal, mas para mim não é, ora, nunca passei por isso antes! Que medo tive de perder! Perdê-lo e perder tudo o que já vivi nestas semanas, todo amor que já sinto. Mas não era nada demais, era coisa normal mesmo, graças a Deus, mas meu espírito de São Tomé precisava constatar isso.
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Chegou o quarto do nenê. Eu olho e nem me lembro das prestações a pagar. Toda noite passo algum tempo ali, imaginando, imaginando...
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Dificuldades? Ah tem (o que não tem?), mas não importa. O que eu acho mais pesado? Ir em pé no ônibus final de tarde quando o cansaço é maior.