Primeiro o Ministro Temporão, com todo seu charme, anunciava no programa Roda Viva, que queria promover um amplo debate sobre o aborto. Rapidinho da proposta de debate o Ministro afirmava necessária a prática do aborto como saúde pública. De algo a se discutir ainda – o aborto - já se passa a discutir, debater pois, sob o aspecto da saúde pública (não vale discutir sob outros pontos que não interessem à causa!). Bem, depois o Ministro foi se revelando.
Mas eu falei da discussão sobre aborto, assunto que me interessa bastante, para falar na verdade do projeto de censura prévia que eufemisticamente é chamado de classificação indicativa. O debate foi no Roda Viva, de novo. De novo, pretendem com classificação indicativa uma política pública (Reinaldo Azevedo falou bastante do assunto, vejam lá).
O que me chamou atenção, nos dois casos, é que se discutem coisas indiscutíveis sob os pontos de vista reduzidos que se pretende discutir. Explico-me: se se aceita discutir o aborto ou a classificação indicativa em torno do quesito política pública tão somente, então é porque não há mais dúvidas sobre tudo o que vem antes desta conclusão, toda a sustentação já está aceita a priori, faltando alguns pormenores para se colocar em prática. Isso sem falar nas pegadinhas sentimentalistas de que “é para proteger a mulher” ou “proteger as criancinhas”. Entrar nesse tipo de discussão desonesta é fazer o jogo sujo do adversário.
No Roda Viva de segunda passada, Demétrio Magnoli tentou dizer que não discutiria a classificação indicativa naqueles termos [não foi bem assim que ele disse, não me recordo] e o comportamento foi taxado de antidemocrático, afinal aquilo ali era um debate democrático e tal, a discussão pegou fogo (ah, não vale falar exaltado, tem que falar mansinho, miudinho) e Paulo Markun aplacou os ânimos e passou um pito.
Por esse entendimento de debate democrático, Deus teria que discutir com satã. Discutir não, debater de igual para igual. Basta que os dois lados estejam representados em mesmo número de debatentes (um neologismo, não sei se já existe) e as regras sejam iguais para os lados. Pronto. Em muitos casos, como do aborto e da censura, isso é mais uma discussão desonesta que qualquer outra coisa. Recuse-se a discutir, pronto, gritaria geral e dedos apontados para tua cara “antidemocrático, antidemocrático”, ou em outros casos “carola, fundamentalista” e coisa pior (pior mesmo? Ser carola é pior que ser abortista?). Daí a tentar se explicar que não se é carola (ou discutir o que se entende por), que não se é fundamentalista, a discussão foi por água abaixo.
Então, com isso eu não disse necessariamente que é para fugir da discussão, mas não fazer o joguinho sujo do outro com quem se discute. Se é para entrar no debate, então que se discuta, que se combata o bom combate. Até rimou.